Todo mundo pode empreender! Será?

Este artigo foi publicado no dia 14/01/2020 no Portal Batalha das STARTUPS

Os livros de autoajuda dizem que você pode tudo, inspiram e motivam as pessoas se lançarem. Mas isso é bom?

Você pode tudo!

Todo mundo pode tudo!

Você pode ser o que quiser!

São os mantras dos livros de autoajuda, e quem sou eu para discordar.

As redes sociais estão cheias de histórias de superação onde pessoas vencem barreiras aparentemente intransponíveis e alcançam objetivos improváveis, que mostram que tudo é possível.

Mensagens inspiradoras e positivas são sempre bem-vindas!

Mas devem ser feitas, sempre, com responsabilidade. E isso nem sempre acontece.

Para cada história de sucesso, há milhares ou milhões de pessoas que ficaram pelo caminho. O risco, e em minha opinião a irresponsabilidade, dos livros de autoajuda e das histórias de superação da internet, é que transmitem uma ilusão de que é fácil converter a exceção em regra.

Vou contar uma experiência pessoal.

Com 26 anos eu saí do país, sem falar o idioma do país para onde eu fui, com pouco dinheiro, sem experiência internacional e com uma esposa grávida. Trabalhei muito, me esforcei e venci. Construí minha vida, minha família e uma excelente carreira, cheguei executivo de uma multinacional.

Mas também conheci centenas de pessoas que foram para o mesmo país e cidade que eu, trabalharam tão duro quanto, mas voltaram frustrados e com uma mão na frente e outra atrás.

Lembro até hoje da conversa com uma prima, que me disse “eu quero sair do país, aqui nada dá certo pra mim, ninguém me da uma oportunidade.”

Ela sempre teve uma visão de que o mundo estava contra ela, que ninguém gostava dela, enfim…

E continuou…

“Quero ir para fora como você, eu não tenho preguiça, trabalho no que precisar. Como não falo nenhum idioma, além do português, minha ideia é trabalhar de garçonete, trabalhar duro, mais e melhor que todos as outras garçonetes, aprender o idioma nas minhas horas de folga, e tenho certeza que em alguns meses, com muito esforço, serei promovida a responsável dos garçons, depois a gerente, e em poucos anos, talvez seja sócia ou monte meu próprio negócio.”

Eu a ouvi com paciência e fiz somente uma pergunta:

“O plano me parece fantástico, mas por que você não faz o mesmo aqui? O que te faz pensar que sair do seu país, ir para um lugar onde você não fala o idioma, não conhece a cultura e não tem documentação, vai ser mais fácil que aqui?”

Ela ficou em silêncio, embora nunca me dissesse, mas eu imagino que tenha sentindo um ódio mortal de mim, por eu ter, supostamente, me unido ao resto da humanidade para estar “contra ela”.

Eu não sou ninguém para dizer quem deve ou não deve sair do país, quem deve ou não deve empreender, enfim, todo mundo tem o direito de fazer o que quiser, porém, me preocupa que tomem este tipo de decisão baseados somente nos casos de sucesso, que são a imensa minoria.

Os aspirantes a empreendedores devem considerar também os milhões de casos de fracassos e, o mais importante, saber se tem as características, as competências e as habilidades necessárias para empreender.

Eu não concordo com os livros de autoajuda que dizem que todo mundo pode tudo. Melhor dizendo, eu concordo apenas parcialmente com esta afirmação.

Sim, todo mundo pode fazer o que quiser, mas nem todo mundo pode fazer o que quiser com excelência.

E neste pequeno matiz é onde reside a diferença entre o sucesso e o fracasso.

Todo mundo pode ser vendedor?

É óbvio que sim.

Mesmo pessoas tímidas, que não se comunicam ou se expressam com eloquência.

Pessoas que não saibam negociar.

Enfim, existem cursos que podem te ensinar todas as competências necessárias para ser um vendedor. E isso ajuda muito.

Agora, a pergunta que devemos nos fazer:

Todo mundo pode ser um excelente vendedor?

Eu entendo que não.

Todo mundo pode ser jogador de futebol? Sim!

Todo mundo pode ser um craque? Não!

Todo mundo pode empreender? Claro que sim.

Todo mundo vai ter sucesso como empreendedor? Não!

A diferença entre um empreendedor “normal” e um empreendedor brilhante pode ser a falência.

Em um mundo cada vez mais competitivo, na corrida das startups não tem havido espaço para empreendedores normais, padrões e muito menos para medíocres.

Temos que ser responsáveis com as mensagens que damos, não podemos empurrar todo mundo da beirada do precipício para descobrir quem é capaz de voar.

Para empreender é necessário muito mais que um curso do Sebrae.

Isto é só uma pequeníssima parte. É necessário ter competências e principalmente atitudes que nem todo mundo tem. E não há nenhum problema nisso.

Como eu tratei em meu artigo A bipolaridade do empreendedorismo: Gênio ou inútil, nem todo mundo precisa ser empreendedor, executivo, chefe, rico, ou ter qualquer outro estereótipo para ser feliz.

Eu jamais diria se você deve ou não empreender.

Só te convido a uma reflexão e, mais que isso, a uma ação concreta.

Antes de queimar a sua rescisão e suas economias em um empreendimento, você deve saber se tem o perfil de empreendedor.

Existem ferramentas e profissionais no mercado que podem te ajudar com isso.

Conhecer os gaps que você tem e avaliar se o esforço para reduzir ou eliminar estes gaps valem a pena.

A partir daí, começa o processo para empreender.

E se o esforço for tão grande a ponto de não valer a pena?

Não há problema algum.

Quem disse que você precisa empreender para se realizar?

E se conseguir, mas não for acima da média?

Também não há problema algum.

Quem disse que você precisa ser um empreendedor brilhante e de sucesso para ser feliz?

Imagens: Pixabay

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